skip to Main Content

Artigo: Prejuízos para a educação durante a pandemia

Artigo: Prejuízos para a educação durante a pandemia

E quem não teve prejuízos nesta
pandemia? Inegável a grande extensão de danos que a pandemia da COVID-19 deixou
em toda a humanidade. Vidas, famílias, sonhos destruídos. Para a economia,
vivenciamos dramas e paradoxos que nos imprimem uma difícil reflexão entre o retorno
das atividades e o distanciamento social. Aquém de discussões sobre qual o
melhor caminho a seguir, a realidade já se apresenta em dados em que as perdas
se avolumam. Na educação, da infantil até a superior, não é diferente.O olhar linear que muitos
impuseram à educação ao longo de décadas no Brasil repercute fortemente na
pandemia, em que modelos de mediação tecnológica despontam como solução. Além
dos obstáculos sociais, tecnológicos, familiares, atitudinais, entre outros, que
as dimensões do território brasileiro impeliram a educação, mesmo antes da
pandemia, com a COVID-19 uma complexidade exponencial de demandas eclodiu e
ainda interrompe por dias e meses as aulas presenciais.Desde 20 de março, apenas nos
países de Comores, Honduras, Rússia e Singapura, houve aulas. No Brasil, são
130 mil escolas fechadas, 296 universidades públicas com aulas suspensas, mais
de 59 milhões de estudantes sem poder estudar, segundo estimativa do Banco
Mundial. Esse cenário, fez com que o ambiente da sala de aula, espera-se que
temporariamente, fosse transportado para as residências dos brasileiros,
naquelas instituições que têm condições de ofertar tal modalidade.As desigualdades sociais neste
ponto alargam ainda mais a discrepância no aprendizado, pois se muitas
instituições de ensino, públicas e privadas, não possuem condições de oferta, também
não são todos os domicílios e famílias brasileiras que têm suporte para aulas
por mediação tecnológica em casa. Segundo o portal Todos pela Educação², no Brasil,
67% dos domicílios possuem acesso à internet, em que 99% para aqueles da classe
A, 94% da B, 76% da C e 40% da DE. Além de que apenas em 42% dos domicílios
(sendo 47% na classe C e 9% na DE) possuem computador em casa. O que nos
desperta a necessidade de um olhar atento para cenários em que a falta de
conectividade ou mesmo a instabilidade da conexão à internet prejudica aulas
síncronas, bem como denota prejudicial a leitura por meio de smartphones, quando
estes são disponíveis para as famílias brasileiras.Não bastasse tal obstáculo
tecnológico, que é essencial para a realização das aulas síncronas, o apoio dos
pais nas atividades remotas de seus filhos é base para a educação, tanto antes
quanto agora, ela é crucial pois muitos alunos não possuem habilidades para
estudo independente, conforme aponta estudo feito pelo Global Education
Innovation Initiative de Harvard e a OCDE Rapid Assessment of COVID19 Education
Response³. Os próprios pais têm de lidar com suas atividades de home office,
além da divisão dos afazeres domésticos e de eventuais conflitos psicológicos
comuns para qualquer pessoa em isolamento social. O suporte das instituições de
ensino, portanto, devem contemplar apoio às famílias para que todos possam
cooperar para um ambiente adequado ao aprendizado, o que também alivia e pode
contribuir para redução de eventuais conflitos familiares.Importante mencionar que, neste
ambiente de aprendizado, a alimentação escolar, em especial nas escolas
públicas, sempre foi uma das políticas públicas não apenas educacional, mas de
segurança alimentar, que se mostrou prejudicada, tendo algumas iniciativas governamentais
levado até as famílias dos alunos a alimentação necessária para a sua subsistência.
O ambiente familiar deve guarnecer o estudante de toda tranquilidade e apoio para
o melhor rendimento escolar. No entanto, nas residências brasileiras, ainda
coexiste um cenário onde quase 500 mil crianças estão submetidas à desnutrição,
segundo dados do Mapeamento da Insegurança Alimentar e Nutricional do
Ministério da Cidadania4. Entremeios, um dos principais
atores no processo educacional teve mudança brusca na modalidade de ensino e
necessitou rápida adaptação e absorção de diversos conhecimentos. O professor
desenvolveu rapidamente o manuseio de plataformas assíncronas e construiu novo planejamento
com estratégias de ensino voltadas para a mediação tecnológica. Diga-se de passagem,
que o conhecido EaD, com uso de tutores e plataformas de conteúdo, não se confunde
em nada com o autorizativo da Portaria n.º 343, de 17 de março de 2020, do
Ministério da Educação 5. As competências e habilidades
necessárias para plena formação do profissional não se resumem apenas em hard
skills. O conhecimento científico pode ser facilmente traduzido com uso e
auxílio de plataformas digitais, já que as bases teóricas podem ter fácil
absorção mediante uma boa bibliografia acompanhada de um equilibrado sistema de
avaliação. Contudo, as practical skills e as softs skills não dispensam a
figura do professor. O conhecimento prático, regionalizado, traduzido pelos
próprios instrumentos avaliativos do MEC, pela experiência profissional
docente, pela necessidade da sua figura plena, além de que as habilidades de relacionamento
interpessoal que se impunham aos alunos no presente século para o trabalho em
equipe, a criatividade e a inovação fazem do professor ator indispensável no
processo educacional, bem como a aula presencial em grupo para uso das
conhecidas metodologias ativas.Ressalte-se que, mesmo em
ambientes de aprendizagem online, o papel de acompanhamento da evolução e de
dificuldades do aluno fazem do professor, como sempre foi, um mediador de
conteúdo, transformando uma linguagem complexa e científica em texto acessível
e adequado ao contexto regional do mercado de trabalho que espera àquele
discente. A confiança e a experiência docente em sala de aula, presencial ou
remota, fazem com que o aluno possua segurança no aprendizado e alcance melhor
absorção das habilidades ali necessárias.Em recente consultoria6, a Atmã
Educar, empresa que implementa soluções educacionais inovadoras, estima que as
matrículas de meio de ano devem cair em 70% no ensino superior privado, além de
um impacto forte na inadimplência e na renovação de matrículas dos alunos
veteranos. A solução apontada pela empresa visa a adesão a modelos híbridos de
ensino, em que 40% do currículo sejam praticados de forma totalmente em EaD,
como autorizado pelo MEC antes mesmo da pandemia, com o objetivo de reduzir uma
das maiores despesas das IES que é o custo com o professor.Ao que parece, esse pode ser um
dos maiores prejuízos para a Educação do Brasil, a substituição do Professor
pelo EaD, sem observância do contexto regional de aprendizado, tão pouco da
experiência profissional que se exige de qualquer área do conhecimento. Ao
observar a própria consultora que realizou o estudo, percebe-se que a inovação
no caso vincula-se a práticas de inteligência artificial, baseado em conteúdos
preexistentes em banco de dados criados por meio de profissionais que podem
estar localizados em qualquer local do Brasil, bem como em outros países, pois
o EaD, no ambiente global da indústria de massa, torna-se um grande aliado da
mercantilização do ensino.As estratégias de retomada das
aulas presenciais, bem como da continuidade de aulas remotas devem saber
priorizar quais objetivos curriculares se pretende desenvolver para melhor
aproveitamento da carga horária escolar diante da necessidade de posterior
reparo de competências e habilidades impossíveis de serem acessíveis por
mediação tecnológica, como reconhecido pela própria Portaria n. 343 do MEC, em
especial no tocante ao estágio supervisionado.Ao observar o pensamento do
Golden Circle de Simon Sinek, percebe-se que o sucesso de grandes
empreendimentos e do alcance de metas está em olhar não para o objetivo real, o
lucro ou o bem da vida a ser ofertado, mas, sim, a razão pela qual aquele
objetivo está sendo traçado ou criado. Todos os outros índices serão
proporcionalmente iguais ao meu dispêndio de forças em construir elos que
explorem a missão da Educação.Os prejuízos são muitos, é fato.
Mas eles serão temporários. O tempo com que nos deparamos para enfrentar tais
problemas não retroage. Quais serão os prejuízos permanentes? Podemos perceber
que nas últimas semanas os índices futuros do Mercado de Ações, um dos setores
mais pessimistas em prognósticos, têm se recuperado fortemente. Mas na Educação
a recuperação do tempo perdido não pode ser açodada nem tampouco superada por
robôs de plataformas digitais que se utilizam da educação bancária como
premissa.O ano letivo se apresenta com um
prejuízo que pode ser amenizado através da mediação tecnológica, observada
quais as prioridades curriculares e a adequação das competências e habilidades
a serem desenvolvidas em ambientes remotos. A importância do professor em sala se
traduz na sua capacidade de adaptação ao ambiente remota e na busca pela
eficiência na mediação do conteúdo. O ambiente familiar deve ser construído por
todos: professores, família, escola, sociedade, instituições de ensino e
governos, para que o resultado do aprendizado seja exponencialmente maior. A
alimentação escolar deve ser continuada, pois o próprio MEC assim o reconheceu,
nas residências com o apoio da família e das Prefeituras Municipais. Superar barreiras
tecnológicas é reconhecer as deficiências existentes e apontar para soluções
diversas, como TV, envio de materiais e até mesmo o homeschooling.

O cenário atual de prejuízos para
a educação brasileira é temporário e deve ser superado por todos em breve, com
temperança e serenidade. As saídas tecnológicas de mediação da aprendizagem se
mostram efetivas quando se possui todos os ingredientes em nossa casa, o que,
como visto, não é a realidade da maioria dos brasileiros. Assim, os papeis da
Escola e das Instituições de Ensino Superior se mostram em serem facilitadores
da aplicação de tais mudanças nos lares. O que não se deve aceitar é que
mudanças temporárias se tornem prejuízos permanentes para a educação.Thiago Carcará, doutor e mestre em Direito Constitucional pela UNIFOR, professor adjunto I e coordenador do Curso de Direito da UESPI. Advogado, conselheiro federal, presidente da Comissão Especial de Direito à Educação do Conselho Federal da OAB.² Nota técnica ensino a distância na educação básica frente à pandemia da Covid-19³ Um roteiro para guiar a resposta educacional à pandemia da Covid-19 de 20205 Portaria n.343/20206 Exame in
Fonte: OAB – Artigo: Prejuízos para a educação durante a pandemia

Back To Top
Search